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Entrevista com Maria Lúcia Resende Garcia, autora de Geração 60

Alfa Omega: No período da ditadura militar muitos grupos e pessoas se insurgiram contra a falta de liberdade. Uns através de ações armadas, outros dentro do esquema político permitido, o bipartidário, outros optaram pela ação política clandestina de arregimentação e organização populares. A história, a mídia, retrata os aspectos mais espetaculares: a luta armada, as ações aventureiras, a guerrilha. Como analisa essa questão?
Maria Lúcia Resende Garcia: Após termos vivenciado um período de grande participação política durante o governo João Goulart, com o golpe encontramos na ditadura militar a castração das liberdades, a falta do debate das questões sociais e políticas do Brasil.
Quanto a luta armada ser mais comentada na mídia nos dias atuais, acredito que isso se dá pela repercussão que teve na época, até mesmo divulgada pela ditadura visando isolar politicamente os patriotas que se insurgiram contra ela, como também a literatura disponível é mais ampla. A Ação Popular (partido em que militei), embora tenha evoluído para a proposta da luta armada tinha como meta, a médio e longo prazos, a “guerra popular” — mobilização, organização e participação das “massas” operário-camponesas. Não existia o enfoque da guerrilha ou ações armadas isoladas.

Alfa Omega: Como a senhora avalia a repercussão para os dias de hoje do trabalho político desenvolvido pelos seus companheiros e pela senhora?
Maria Lúcia Resende Garcia: A marca da luta estudantil, do movimento operário, a experiência vivida pela geração dos anos 60 foi fundamental para a retomada da democracia e das liberdades no Brasil. Os que sobreviveram, exilados ou na clandestinidade, com a anistia, boa parte esteve e está presente na reconstrução do país, seja na luta pelas “diretas já”, pela Assembléia Nacional Constituinte, na organização dos partidos políticos, nos parlamentos ou nos poderes executivos, tanto no plano nacional, estadual ou municipal.

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Entrevista com Ernesto Araújo, autor de Xarab Fica

Alfa Omega: Do mesmo modo que seu primeiro romance, A porta de Mogar, também este segundo passa-se em um país imaginário. Desta vez trata-se de Xarab. Pode falar um pouco sobre esse lugar?
Ernesto Araújo: Para mim é um pouco difícil falar de Xarab assim, de fora, porque só conheço Xarab de dentro. É como se me pedissem para falar do Brasil em poucas palavras: que poderia dizer sem cair no óbvio? Que é um país grande, verde, complexo? Tudo isso seria frio e sem vida. Só os países estrangeiros são realmente países: para cada pessoa, o seu próprio país não é um país, mas sim uma experiência, uma percepção íntima. Os outros países são por acaso, são relativos, enquanto o nosso é necessário e absoluto. O livro, aliás, é um pouco sobre isso, sobre essa especificidade da Pátria. Direi que Xarab é uma cidade irrequieta à beira de um golfo, a memória de uma guerra perdida, a consciência de ter algo a defender, algum segredo que o resto do mundo desconhece. Xarab é um povo que deseja transcender a verdade. Xarab é uma rainha cansada que sente aproximar-se o fim e escolhe uma sucessora, uma moça que tentará provar que é digna do reinado. Xarab é a dúvida sobre si mesmo unida à vontade de perseverar.

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Entrevista com Jade Gandra Martins, autora de Tempo de guerrilha

Entrevista concedida a Jaci Dutra

Alfa Omega: É um romance histórico com uma história de amor. Como você conseguiu casar os dois assuntos e não se perder em chavões?
Jade Gandra Martins: O livro narra a história de Charllote e Vinícius, durante o período conturbado pré-João Goulart e durante a ascensão e auge da ditadura militar. Transformam-se em guerrilheiros urbanos e lutam almejando um país melhor. Não quis criar um romance apenas relatando fatos históricos. Tinha de haver mais na caracterização das personagens, e haver um pano de fundo paralelo à política. Quis mostrar os conflitos, pois os guerrilheiros tinham também uma vida pessoal que ficaria para trás na hora de empunhar suas bandeiras, uma vida de casamento, filhos, passear na praia, mas o coletivo prevalece. E isso lhes custa sua história de amor.

Alfa Omega: Qual a base do livro, de onde surgem os outros assuntos?
Jade Gandra Martins: O pano de fundo é o seqüestro do embaixador americano no Brasil, táticas de guerrilha, comunidade hippie, drogas, liberação sexual.

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Entrevista com Paula Loureiro da Cruz , autora de Alexandra Kollontai – Feminismo e Socialismo

Entrevista concedida a Antônio do Amaral Rocha

Alfa Omega: Profa. Paula, para introduzirmos questões sobre a atuação da feminista Alexandra Kollontai, nos tempos da revolução russa, seria interessante que a senhora discorresse sobre como se encontra a situação da mulher no estágio atual.
Paula Loureiro da Cruz: Com a entrada da mulher no mercado de trabalho e as conquistas efetuadas na esfera legislativa, tais como igualdade de direitos assegurada pela Constituição, direito ao voto, licença-maternidade, licença para amamentação, entre outras, pode-se dizer que as mulheres conquistaram a sua emancipação. Todavia, não conseguiram atingir a tão sonhada libertação, pois remanescem diversos elementos que a mantém em situação de opressão na sociedade contemporânea.

Alfa Omega: Sabemos que a afirmação da mulher como um ser humano com os mesmos direitos dos homens é uma batalha que tem demandado esforços de pensadoras e pensadoras em diversas áreas de atuação. Alessandra Kollontai foi a primeira pensadora de peso a sistematizar essas reinvidicações? Ou a sua atuação foi fruto de uma evolução? Pode-se traçar um paralelo com outras atuações de peso acontecido antes dela?
Paula Loureiro da Cruz: Alexandra Kollontai destaca-se como uma das principais autoras pioneiras do feminismo marxista, ao lado de Rosa Luxemburgo e Clara Zétkin. Seu pensamento aprofunda as considerações efetuadas por Engels, na obra A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Sua notoriedade é vista com a inovadora análise marxista sobre a “moral sexual”.

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Entrevista com Boris Koval, autor de Heroísmo trágico do Século XX

Alfa Omega: Sr. Boris Koval, o senhor é conhecido no Brasil pelo seu livro História do Proletariado Brasileiro (1857-1967), publicado também pela Alfa-Omega. Agora, ao completar cinqüenta anos de sua atividade intelectual como “brasilianovsky” e como estudioso dos movimentos de libertação da América Latina e revoluções do século XX, o senhor nos apresenta seu “Heroísmo trágico do século XX – O destino de Luiz Carlos Prestes”.
Em determinado momento do livro, o senhor diz que está na moda hoje em dia criticar nossos pais e avós, reduzindo a importância de sua participação nos destinos do mundo. Como se sua luta não tivesse sentido. Em que medida a vida longa de 92 anos de Luiz Carlos Prestes, em seus 68 anos de luta revolucionária (dentro dos quais passou 15 no exílio, 9 na prisão e 17 na clandestinidade) pode resgatar nas novas gerações o amor ao Brasil, sua principal característica? Qual o seu exemplo? E por que razão o ex-tenentista, comunista e líder revolucionário brasileiro é visto como um herói?
Boris Koval: Eu acredito que se pode realmente definir Prestes como homem-herói de sua época, isto é, do século XX. O heroísmo é um fenômeno complexo e tem uma série de critérios:
a) Heroísmo como forma de conduta pessoal em condições extremas, isto é, coragem, espírito de sacrifício, desprezo pela morte;
b) Como perseguição fanática, rigorosa de uma idéia, ideal, objetivo, apesar do perigo para a própria vida;
c) Como feito heróico concreto, cumprimento do dever, bravura, fidelidade ao juramento, ato patriótico ou revolucionário;
d) Como expressão superior da energia espiritual e moral na luta pela causa comum,liberdade e justiça, felicidade do povo e da pátria, a defesa destes contra os inimigos e o mal;
e) homem-herói é um exemplo de força de vontade, valentia, amor ao próximo;
f) heróis são pessoas honradas, de mentalidade livre, fraternidade; os melhores deles são muito carismáticos, capazes de desempenhar papel de líder, ideólogo; não são anjos, mas pessoas normais, que se diferenciam das outras por missão especial e energia espiritual, capazes de assumir as principais responsabilidades. Cada época tem seus heróis. Lembremos os heróis da República dos Palmares (século XVII), a Conspiração dos Inconfidentes (1789), as revoltas republicanas populares do século XIX (guerra dos Farrapos, Cabanada, Sabinada, Balaiada e outras), o movimento dos camponeses em Canudos (fim do século XIX e outros), a luta contra a escravidão e pela república. Os nomes das maiores personalidades entraram na história do Brasil para sempre. O século XX trouxe à vida novos heróis – João Cândido, que encabeçou a revolta dos marinheiros em 1910, Astrogildo Pereira, Octávio Brandão e outros líderes do movimento operário, os tenentistas Antônio Siqueira Campos, os irmãos Joaquim e Juarez Távora e Hercolino Cascardo.

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Entrevista com André Araújo, autor de A Escola do Rio

AlfaOmega: Seu livro A Escola do Rio – Fundamentos políticos da nova economia brasileira trata de economia ou de política?
André Araújo: Trata de economia política, ciência um pouco enfraquecida nos nossos debates econômicos, hoje muito voltados para o economics, ou seja, práticas de operação da economia. A economia política se ocupa da gênese dos processos econômicos, e nesse sentido recorre mais à história e à vida social do que à teoria econômica.

AlfaOmega: Nessa visão, exposta no seu livro, o Plano Real foi uma operação essencialmente técnica ou uma manobra política?
André Araújo: Foi a aplicação na realidade brasileira de uma subideologia, gestada nos anos 40 e 50, que via o Brasil como país subordinado a um sistema maior, construído a partir do fim da Segunda Guerra, percepção que por sua vez está enraizada no liberalismo clássico da Escola inglesa. Por essa concepção, o Brasil não deveria procurar ser uma potência industrial porque sua vocação seria essencialmente agrícola e mineral. Essa posição não é nova, governou o Brasil desde o descobrimento até a Revolução de 30. Foi Vargas quem implantou uma outra visão de país, criando as bases da indústria e do nacionalismo econômico que construíram o Brasil moderno. Sem essa mudança de rumos, o PIB brasileiro seria hoje muito menor e nosso país seria uma grande Guatemala, vivendo da lavoura e da exportação de alguns minérios.

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Entrevista com Nilson Araújo de Souza, autor de A Longa Agonia da Dependência.

Alfa Omega: Prof. Nilson, a quem se destina este seu livro, qual seu público-alvo?
Nilson Araújo de Souza: Em primeiro lugar, a professores e alunos da disciplina Economia Brasileira Contemporânea dos cursos de ciências humanas, tais como Economia, Administração, Ciências Sociais, Ciências Políticas, Comunicação, Antropologia, Relações Internacionais, dentre outros; segundo, aos formadores de opinião; terceiro, aos que têm a responsabilidade de tomar decisões sobre os rumos da economia, ou a capacidade de interferir nessas decisões; por último, mas não menos importante, aos que, nas trincheiras das lutas sociais ou políticas, lutam por um Brasil melhor.

Alfa Omega: E os que querem manter o status-quo?
Nilson Araújo de Souza: Certamente, eles vão ter interesse em ler este livro porque, seguramente, estão interessados em descobrir as causas da longa agonia da dependência, ou seja, querem saber por que não deu certo o “modelo” que tanto os beneficiou durante tanto tempo.

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Entrevista com Ivan Godoy, autor de Polônia.

Entrevista a Antônio do Amaral Rocha

Alfa Omega: Caro autor, o senhor já escreveu sobre a Alemanha, Argélia, União Soviética e Bulgária, entre outros, sempre traçando um perfil detalhado dos países e agora escolheu a Polônia. Por que a Polônia?
Ivan Godoy: É um país fascinante, que deu ao mundo figuras como Chopin e Rubinstein, na música; vários ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura, cineastas como Wajda, Polanski e Kieslowski, cientistas como Copérnico e Madame Curie, líderes políticos e sindicais como Lech Walesa e um dos papas mais marcantes de todos os tempos: João Paulo II. Além disso, tem uma história milenar de luta pela independência e pela conservação de sua identidade nacional. Lá ocorreram fatos decisivos, que influenciaram a evolução de toda a Europa, como a a batalha de Grunwald, em 1410, em que foram derrotados os Cavaleiros Teutônicos. De lá partiram as tropas de Napoleão para a invasão da Rússia, que marcou o começo do fim do imperador francês. E lá foi iniciada a Segunda Guerra Mundial, em 1939, quando as forças nazistas invadiram o território polonês. Mas principalmente foi na Polônia que surgiu o Sindicato Solidariedade, que deu a largada para o processo de mudanças que pôs fim ao bloco socialista – e portanto à divisão da Europa em dois sistemas antagônicos – e teve como maior símbolo a queda do Muro de Berlim.

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Entrevista com Ivan Godoy, autor do livro Argélia – 50 anos de independência.

Alfa Omega: Por que você decidiu escrever um novo livro sobre a Argélia?
Ivan Godoy: Tive dois motivos principais: o fato de o país comemorar em 2012 o cinquentenário da independência e o interesse dos leitores pelo Oriente Médio e o Norte da África com a eclosão da chamada Primavera Árabe. O primeiro ponto se justifica porque é uma data redonda, marcante para qualquer nação. E mais ainda para um país onde o processo de descolonização se deu de uma forma violenta e heroica. A Guerra da Argélia foi uma das grandes epopeias do século XX, quando um milhão e meio de argelinos morreram para conquistar a independência, após 132 anos de domínio colonial francês. Assim, era preciso falar sobre o que aconteceu nestas cinco décadas, qual o caminho que os argelinos trilharam, o que mudou em todo esse tempo. Tudo isso reforçado pela importância de um país que é o maior da África – desde que o Sudão se dividiu em duas nações – e tem uma potente economia baseada no gás e no petróleo, nessa ordem. Quanto à Primavera Árabe, embora tenha gerado muito interesse e muitas esperanças, seus resultados a longo prazo ainda são incertos, pois tem se caracterizado pela emergência de setores fundamentalistas islâmicos e pela instabilidade política. Era preciso explicar porque o efeito dominó, com a derrubada de sucessivos governos, não afetou a Argélia.

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Entrevista com Marcelo Gomes Franco Grillo, autor de O Direito na filosofia de Slavoj Zizek

Entrevista concedida a Thiago Calheiros

Alfa Omega: Seu livro inscreve-se no âmbito da Filosofia do Direito, especificamente no círculo de juristas que tem o jusfilósofo Alysson Mascaro como grande referência. Você poderia descrever que papel tem cumprido as teorizações deste grupo?
Marcelo Gomes Franco Grillo: Gostaria de dizer, em primeiro lugar, que o Prof. Alysson Leandro Mascaro vem assumindo um papel importantíssimo no pensamento jurídico crítico brasileiro, com raras exceções, como poucos na história jurídica e jusfilosófica do País. Isso salta mais aos olhos, se considerarmos os professores da faculdade de Direito da USP, onde tradicionalmente, a linha de pensamento é tradicional e conservadora. Mascaro, além de ter se
estabelecido com esse rigor crítico na faculdade de direito da USP, mais surpreendentemente, ainda, criou um grupo de alunos críticos na Universidade Presbiteriana Mackenzie, a qual, por longos anos, apesar de sua excepcionalidade na graduação, não teve nenhuma tradição na pesquisa científica, e, atualmente, assume, sem medo de errar, um dos postos de berço do pensamento jurídico crítico brasileiro.
A teorização do grupo de alunos que se formou em torno do Prof. Alysson Mascaro, na pesquisa de Mestrado de Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, tem sua base teórica mais aguçada no marxismo jurídico. Mascaro e seu grupo desenvolve um trabalho inédito no Brasil e quiçá no mundo: sintetizam as teorias jurídicas dos grandes pensadores marxistas ou de extenso diálogo com o marxismo, como é o caso exemplar das pesquisas em Bernard Edelman, Georg Lukács, Wilhelm Reich, Umberto Cerroni, Galvano Della Volpe, Nicos Poulantzas, Theodor Adorno, Celso Furtado e o próprio Slavoj Žižek.
Mas não só no marxismo jurídico concentra-se o grupo. Em geral, a posição crítica do direito, perpassa autores como Foucault, Carl Schmitt e Heidegger. Os estudos, em torno do professor Mascaro, são, não só marxistas, porém, considerados de uma forma ampla, antiliberais e antipositivistas. Daí, também, trabalhos que priorizam temas tais quais: o direito e a questão racial, a perspectiva material da democracia e da cidadania, o movimento feminista, os direitos humanos e o direito criminal.

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Far far away, behind the word mountains, far from the countries Vokalia and Consonantia there live the blind texts.