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Entrevista com Marcelo Maccaferri, autor de Alma, Gesto

Entrevista concedida a Antônio do Amaral Rocha

Alfa Omega: Estrear na literatura com um prêmio importante como o PAC que significado teve para você?
Marcelo Maccaferri: Sem dúvida é um reconhecimento. Mas principalmente me alerta o quanto não devo me iludir com a distinção. Porque o início não aconteceu com o prêmio e o fim eu deixo aos póstumos.

Alfa Omega: Qual é o grande tema do poeta e da poesia?
Marcelo Maccaferri: Depois do século XX não é mais possível falar de um tema específico na poesia. Mas se a vida, uma vez indicada, é Arte, eu diria então que a poesia fala das dúvidas e dos absurdos da existência.

Alfa Omega: Como e quando você se deparou com a necessidade de fazer poesia?
Marcelo Maccaferri: Não faço poesia, mas me utilizo das palavras como matéria-prima para Arte. Eliminemos de uma vez por todas as categorias e as classificações, que generalizam a matéria e encobre suas nuances e sua atualidade. No livro “Alma, Gesto” solicitei propositalmente ao editor a declaração “Palavras e Ilustrações do autor”.

Alfa Omega: Que poetas são de fundamental importância para sua formação de leitor e escritor de poesia?
Marcelo Maccaferri: Seriam muitos na filosofia, na literatura, nas artes plásticas e na vida. Catalogando alguns: Nietsche, Kierkegaard, Deleuze, Camus, Merleau-Ponty, Bérgson, Heráclito, Clarice Lispector, Lygia Clark, Hélio Oiticica, Ferreira Gullar, Hilda Hilst, Virginia Wolf, Henry Miller, Raduam Nassar, o sempre Drummond, Pessoa, Cabral, TS Eliot, Rilke. Algumas visitas ao poeta francês René Char (muito importante) e aos italianos Eugenio Montale e Cesare Pavese. E ainda aprendo com Emily Dickinson e Hart Crane etc. Com certeza estou esquecendo um monte.
Acrescentaria alguns nomes a esta lista: como os performers Mi Rodrigues e Diogo Bo, como os filósofos Rodrigo Meneses, Peter Per Pearl, Luís Felipe Ponde, Tomás Troster, Walther Von Der Vogelweide e Vitor Mônaco Loureiro, a crítica de dança Helena Katz, o escritor Marcelo Coelho, os poetas Gabriel Kolyniak e Antero Kalik, o compositor e estudioso de música contemporânea Felipe Ribeiro, o pensador-multimídia Guilherme do Vale (Gli Altri) entre muitos.

Alfa Omega: Se você fosse definir sua poesia, que definição que daria para ela?
Marcelo Maccaferri: Aquela que não sabe quem e o quê é, mas que por alguma razão acredita, ou seja, é MOVIMENTO.
A língua dança (é corpo) no palco vazio da boca. Seu hálito são trechos nunca visitados. Sua forma é a inexistência, é a palavra.

Alfa Omega: Você tem também uma militância nas artes plásticas. Qual a relação que faz entre poesia e artes plásticas?
Marcelo Maccaferri: Não milito e não sirvo a causas, simplesmente descubro (-me) Arte! Aprecio a idéia de uma fronteira móvel entre as linguagens, ora tocando-se ora se (con)sumindo mutuamente. É justamente neste espaço que minha poesia flutua, dissolve: nas fronteiras. São nas fronteiras que ocorre o desequilíbrio, e isto me surpreende, pois lá a Poesia é viva.
Gosto de uma frase de Merleau-Ponty que diz: “não é o escultor que esculpe a escultura, é a escultura que esculpe o escultor.”
Ou seja, a matéria (de)forma o artista, o artista, no caso, a própria matéria.

Alfa Omega: E entre poesia e filosofia?
Marcelo Maccaferri: São maneiras (procedimentos, impossibilidades) diferentes de investigar. Considero, por exemplo, Drummond o maior filósofo que o Brasil já teve. Mas tanto poesia como filosofia são inúteis: é aí que se encontra a fascinação: a busca de um desespero.

Alfa Omega: Qual recepção você espera ter com a sua poesia?
Marcelo Maccaferri: Esperamos sempre ser bem-vindos. Mas se não somos: muito obrigado, passe bem e até a próxima; bato noutra porta.

Alfa Omega: Sabemos que os movimentos poéticos da atualidade se dão entre grupos, os chamados “guetos”. Você participa de algum deles? O que você acha desses grupos?
Marcelo Maccaferri: Não chamaria de guetos ou cercas de arame farpado. Existem pessoas que gostam de alguma coisa, outras que não gostam e ainda outras que transitam entre gostar e não gostar, é tudo uma questão de abrangência e/ou distância da “coisa” procurada. No entanto, vejo cada vez mais artistas buscando uma interação maior entre seus pares, entre suas contradições e o público, com o propósito de aprofundar, expandir suas pesquisas e deslocar questões. Sem contar que hoje há muita burocracia na promoção e incentivo da Arte e a união de forças e criatividade ajuda muito a superá-la.

Alfa Omega: E finalmente, qual a função da poesia e do fazer poético hoje em dia?
Marcelo Maccaferri: Nenhuma. A poesia não tem funcionalidade alguma, como a Arte em si também não tem. A única coisa que ela se propõe é revelar (e esconder) sua existência, e faz isso quando se realiza ou se perde. A Arte É.


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Far far away, behind the word mountains, far from the countries Vokalia and Consonantia there live the blind texts.