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Editora Alfa Omega

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Entrevista com Everaldo Augusto, autor de Literatura e documento

Alfa Omega: A obra Cascalho procura retratar, com base em fatos históricos e documentais, a realidade do que ocorreu na cidade baiana de Andaraí, na primeira metade do século XX. Como o senhor avalia essa preocupação com a verdade histórica diante da difusão dos mitos de fora?
Everaldo Augusto: Eu diria que Herberto Sales, em Cascalho, não retratou apenas uma realidade. Em se tratando de uma obra de ficção, eu poderia dizer que ele recriou esta realidade.
O que surpreende a todos que lêem a obra é a força, as cores, e a emoção em que se dá este ato de recriação. Isto faz desta obra literária uma denúncia da degradação social e da banalização da vida daquela multidão de garimpeiros perdida nos sertões da Bahia, com muito mais força que qualquer obra dita histórica, tão somente, ou qualquer discurso diretamente engajado.

Alfa Omega: Em que medida o retrato fiel de uma realidade histórica colabora com a produção de uma obra literária? E em que ela atrapalha?
Everaldo Augusto: Penso que em literatura de ficção não há um retrato fiel da realidade. Eu diria que a Literatura rapta, captura a realidade e a recria pela palavra. Depois a devolve com mais vida ainda que a realidade antes capturada, posto que agora ela está desnaturalizada, perceptível ao olhar e aos sentimentos do homem.

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Entrevista com Aldo Rebelo sobre o livro A Ilusão Americana, de Eduardo Prado (1860-1901)

Alfa Omega: Por que um livro publicado pela primeira vez em 1893 ainda guarda alguma atualidade?
Aldo Rebelo: O livro trata da ilusão na possibilidade de serem resolvidos os graves problemas nacionais a partir do apoio e da ajuda dos EUA, ilusão desgraçadamente repetida cem anos depois pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1993, quando apresentou o chamado Plano Real, imaginando retomar o desenvolvimento do país apoiado no dinheiro volátil e na boa vontade do nosso grande vizinho do Norte.

Alfa Omega: Qual a importância do relançamento de A ilusão americana?
Aldo Rebelo: Os Estados Unidos propõe a formação de uma área de livre comércio nas Américas do Alasca à Terra do Fogo. O exame de tal proposta exige a cautela e a precaução na aproximação com vizinhos poderosos e arrogantes. A obra de Eduardo Prado é paradoxal: ao mesmo tempo em que teve a premonição de denunciar a expansão hegemonista dos EUA, se contrapôs ao movimento renovador da Proclamação da República. Não podemos esquecer que Eduardo Prado era um aristocrata; um homem para quem os valores de uma sociedade nobliárquica, deveria se basear na etiqueta, na linhagem, nos títulos de nobreza. Eduardo Prado era filho de uma das famílias mais ricas de São Paulo. Tinha casa montada em Paris, era ligado aos círculos intelectuais de Lisboa e tinha servido, inclusive, na legação brasileira em Londres. Esse era o seu ambiente, esse era o seu meio. E a República era a negação de tudo isso. A República veio da Guerra do Paraguai, do convívio de soldados negros com oficiais republicanos e anti-escravocratas, como Floriano Peixoto. O anti-republicanismo de Eduardo Prado determinou que para ele o Brasil republicano era um país no qual não se sentia mais à vontade. A República de Floriano era exatamente a negação de tudo aquilo que Eduardo Prado imaginava para o País: era o combate do aristocrata, combate que ele fazia muito mais pela glória de combater do que pela esperança de vencer, porque sabia que a vitória era improvável.

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Entrevista com Ebenézer W. A. Nascimento, autor de Banco Um Inimigo do Povo

Alfa Omega: O título “Banco…” é muito sugestivo. O que veio primeiro, o livro ou o título?
Ebenézer W. A. Nascimento: Vieram juntos. Banco é a base. Inimigo do Povo é a condição inseparável…

Alfa Omega: De onde veio a idéia do livro?
Ebenézer W. A. Nascimento: Escrevi um outro livro, A Retomada do Poder, ainda não publicado, no qual há um capítulo em que falo dos males do nosso sistema financeiro e faço sugestões para uma reforma. Então, senti a necessidade de me estender mais sobre os Bancos e não fazia sentido entrar em tantos detalhes em A Retomada

Alfa Omega: No livro você diz que os Bancos tornaram-se predatórios com a cumplicidade e devido à subserviência dos governos. Lula assumiu sob o compromisso de mudança. O que ele pode fazer para mudar essa relação?
Ebenézer W. A. Nascimento: Esse é um dos grandes desafios de Lula: vencer a resistência, a começar pelo Congresso, para efetuar uma reforma necessária do sistema financeiro. Não entendo muito bem o ritmo que ele está dando ao trato de problemas cruciais como o dos juros altos e, inevitavelmente, dos Bancos. Mas penso que se não tratar do tema dos juros exagerados de forma radical não poderá ter sucesso nos planos econômico e social, pelo menos o sucesso que interessa ao povo.

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Entrevista com Luigi Sarcinella, autor de Salto no Escuro

Alfa Omega: Sr. Luigi, qual a razão principal dos relatos contidos em Salto no Escuro?
Luigi Sarcinella: Colocar em evidência os horrores e a loucura da guerra, uma bestialidade.

Alfa Omega: É sabido que o regime nazi-fascista praticou crimes horrorosos contra a humanidade. O senhor como participante partigiani acha que todos os responsáveis foram punidos?
Luigi Sarcinella: Não. Não todos. Soube-se depois da fuga de muitos guardiões torturadores que se salvaram no anonimato e na América Latina. Alguns foram capturados.

Alfa Omega: Qual é o legado da luta dos partigianos contra o regime nazi-fascista?
Luigi Sarcinella: A liberdade na democracia.

Alfa Omega: O romance Salto no Escuro é assumidamente autobiográfico. O que levou a escrevê-lo há 40 anos atrás e a reeditá-lo agora?
Luigi Sarcinella: Sempre senti a necessidade de escrever um livro útil à sociedade.

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Entrevista com Marcos Alcyr Brito de Oliveira, autor de Sujeito de Direito e Marxismo

Entrevista concedida a Antônio do Amaral Rocha

Alfa Omega: Existe um entendimento do senso comum sobre a acepção “anti-humanismo”. Com certeza, neste seu trabalho o significado é outro. Explique-nos essa diferença?
Marcos Alcyr Brito de Oliveira: Para o senso comum, o humanismo seria atitude que buscaria o desenvolvimento da potencialidade do ser humano ao passo que anti-humanismo seria a negação dessa possibilidade de desenvolvimento humano. No entanto, a concepção humanista, que considera a noção de Homem (essência ou natureza do Homem), a noção de espécie humana ou Gênero humano (essência genérica do homem, definido pela consciência, o coração, a intersubjetividade etc.), etc., na verdade escamoteia as diferenças existentes entre as classes, ocultam a exploração capitalista e a luta de classes, enquanto o anti-humanismo utiliza-se de conceitos mais científicos, menos ilusórios, como modo de produção, mais-valor, etc., ou seja, somente superando conceitos humanistas onde prevalecem das ilusões de igualdade e liberdade, e adotando-se uma ótica anti-humanista é que, de fato, a exploração de uma minoria sobre uma maioria poderá ser superada.

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Entrevista com Ivan Godoy, autor de Argélia Tradição e Modernidade

Alfa Omega: Seu livro é uma reportagem, um ensaio ou um diário de viagem?
Ivan Godoy: Tem um pouco de cada gênero. É o produto de muita pesquisa e de duas viagens à Argélia, que unidas a dez visitas a outros países árabes — sempre como jornalista — me deram as condições para entender um pouco a mentalidade, a cultura e a sociedade desses povos. Falei com muita gente, autoridades, políticos e intelectuais, tanto do governo quanto da oposição, acadêmicos e principalmente pessoas comuns, para poder sentir o que pensam os argelinos do seu país e do mundo. Visitei muitos lugares, de grandes cidades até lugarejos em pleno Saara. Aliás, sobrevoei o deserto numpequeno avião, o que me deu aquela sensação de como os seres humanos somos pequenos diante da imensidão da natureza.
Também li muito sobre o país: livros, revistas, jornais, sites na internet. Tudo foi facilitado pelo fato de os argelinos serem bilíngües e boa parte dos jornais e revistas serem publicados em francês. Assim, não tive intermediários nos meus contatos, pude falar diretamente com as pessoas sem tradutor, ler os jornais, ouvir o rádio, assistir TV, o que deu uma idéia bastante real do país. O resultado final é um livro que não pretende ser acadêmico, mas transmite bastante informação, de uma maneira direta, com uma linguagem jornalística. Em resumo: não é chato, segundo quem já o leu, até porque não fala apenas de política e economia, mas mostra uma visão geral do país e do povo, incluindo costumes, culinária, criação do cavalo árabe, produção de tâmaras e uma atenção especial ao esforço argelino para aumentar o nível educacional da população etc.

Alfa Omega: Por que você decidiu escrever sobre a Argélia?
Ivan Godoy: Em primeiro lugar, sempre me incomodei pelo fato de muita gente dar opiniões superficiais sobre o mundo árabe, baseadas em preconceitos e lugares-comuns. As pessoas no ocidente geralmente não sabem que apenas 20% dos islâmicos são árabes. A maior nação islâmica é a Indonésia, com mais de 200 milhões de habitantes e que não é árabe. Outros exemplos são o Paquistão, a própria Índia, com uma importante minoria muçulmana e o Irã. Eu estava interessado em mostrar a realidade de um país islâmico moderno e laico, pois considero que existe uma visão errada de que estas nações constituem um bloco monolítico de regimes teocráticos e/ou ditaduras retrógradas. Há diferenças marcantes dentro do mundo islâmico, numa gradação que vai desde o desaparecido regime fanático dos talibãs, no Afeganistão, até a Argélia atual. Ou seja, se há ditaduras e monarquias absolutistas, também há democracias ou pelo menos processos de evolução que apontam para a democracia.

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Entrevista com Jose Damião, autor de Os Direitos humanos na perspectiva de Marx e Engels

Não havia, até agora, surpreendentemente, uma única obra publicada em Língua Portuguesa voltada a investigar em quais termos pode-se situar, nos dias atuais, a relação entre o marxismo e os direitos humanos – o que dá a medida de nosso relativo atraso nesse debate.

Entrevista concedida a Antônio do Amaral Rocha

Alfa Omega: O senhor, como estudioso do tema direitos humanos, poderia descrever a situação dos direitos humanos nos tempos de Marx e Engels.

Prof. José Damião: Até quase o final do século XIX, o que se conhecia por direitos “humanos” era apenas a herança deixada pela Revolução Francesa de 1789, uma revolução burguesa por excelência: os chamados direitos civis (liberdade individual, igualdade formal perante a lei, e suas decorrências) e os direitos políticos (votar e ser votado para cargos políticos), direitos esses cujo exercício, contudo, era severamente condicionado pela inserção de classe das pessoas. Os direitos civis eram uma necessidade ao capitalismo triunfante: e liberdade contratual, empresarial, comercial, liberdade para a aquisição e venda de propriedades, livre produção e circulação de mercadorias, liberdade para acumular lucros, “libertação” dos trabalhadores da servidão das glebas feudais para, então, poderem vender “livremente” aos capitalistas a única mercadoria de que dispunham, ou seja, a sua própria força de trabalho – tudo em condições de perfeita “igualdade” jurídica entre compradores e vendedores. A igualdade jurídica, conformadora dos “sujeitos de direitos”, era o pressuposto dos contratos em geral. No lugar dos antigos privilégios de nascimento, atributos antigos dos estamentos sociais do feudalismo, põe-se a igualdade jurídico-formal entre todos, uma “igualdade” que passa a conviver sem constrangimentos com a desigualdade real e montante que continua a existir e a se reproduzir na sociedade. Claro que, tanto a liberdade quanto a igualdade, passam a ter significados práticos muito diferentes entre pessoas de diversa origem de classe. Para as classes abastadas/dominantes, liberdade e igualdade convertem-se em realidades da vida; já para as classes trabalhadoras/dominadas, ambos os conceitos são muito mais virtuais/formais do que reais. Como na arguta observação de Anatole France: “O direito, com seu igualitarismo majestoso, proíbe igualmente, a ricos e a pobres, de furtarem pão e dormirem ao relento”.

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Entrevista com Medeiros Braga, autor d’O Cordel do Manifesto Comunista

O Cordel do Manifesto Comunista é baseado na primeira teoria revolucionária da história, escrita por Marx e Engels. É um trabalho que contribui para inserir a cultura popular na discussão de tema tão essencial — a exploração capitalista, trazendo-a para um nível mais acessível de compreensão.

Alfa Omega: Poeta Medeiros Braga, em que consiste a sua produção literária? 

Medeiros Braga: Certa vez, em pleno regime militar, eu me encontrava em Campina Grande, na Paraíba, e lá estava em um palanque o combativo D. Helder Câmara. E ele falava de Castro Alves, da sua bravura, do seu patriotismo, assim se expressando: Quando entro no Teatro Santa Izabel em Recife, eu me emociono, os pelos do meu braço se arrepiam; é como se eu estivesse a escutar as vozes de Castro Alves no seu patriotismo lírico a declamar, “Auriverde pendão da minha terra/ que a brisa do Brasil beija e balança”. 

E eu também me emocionei ao ouvi-lo, porque D. Helder citava versos do grande poema “Navio Negreiro” e do maior de todos os poetas brasileiros. E porque, também, a Castro Alves eu devo parte da minha formação política. Eu nunca esqueci os dizeres do poeta condoreiro ao afirmar que “a poesia precisa ser o arauto da liberdade; o brado ardente contra os usurpadores dos direitos do povo”. 

A minha produção literária que é composta por romance, conto, artigo, poesia moderna e cordel, é toda ela voltada à conscientização política do povo. 

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Entrevista com Marcos Alcyr, autor de Sujeito de Direito e Marxismo

Tendo como parâmetro Pachukanis, o livro analisa, entre outros temas pertinentes ao marxismo, a questão da subjetividade jurídica em dois autores: Herbert Marcuse, que se baseia nos escritos do Marx da juventude, humanista, em especial a obra Manuscritos econômico-filosóficos de 1844, e em Louis Althusser, que tem como base de suas análises as obras do Marx da maturidade, em especial a obra O capital.

Alfa Omega: Existe um entendimento do senso comum sobre a acepção “anti-humanismo”. Com certeza, neste seu trabalho o significado é outro. Explique-nos essa diferença? 

Marcos Alcyr: Para o senso comum, o humanismo seria atitude que buscaria o desenvolvimento da potencialidade do ser humano ao passo que anti-humanismo seria a negação dessa possibilidade de desenvolvimento humano. No entanto, a concepção humanista, que considera a noção de Homem (essência ou natureza do Homem), a noção de espécie humana ou Gênero humano (essência genérica do homem, definido pela consciência, o coração, a intersubjetividade etc.), etc., na verdade escamoteia as diferenças existentes entre as classes, ocultam a exploração capitalista e a luta de classes, enquanto o anti-humanismo utiliza-se de conceitos mais científicos, menos ilusórios, como modo de produção, mais-valor, etc., ou seja, somente superando conceitos humanistas onde prevalecem das ilusões de igualdade e liberdade, e adotando-se uma ótica anti-humanista é que, de fato, a exploração de uma minoria sobre uma maioria poderá ser superada.

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Far far away, behind the word mountains, far from the countries Vokalia and Consonantia there live the blind texts.